O fruto do Espírito e a verdadeira religião (Gálatas 5.22)
Introdução.
O texto Gálatas¹ nasce da pena de Paulo como uma reprimida
dirigida aos falsos irmãos (judaizantes) que queriam impor aos crentes gentios
a circuncisão como o sinal da aliança feita com Abraão e seus descentes. Para
Paulo essa imposição não tem base alguma e colide com a própria história de
Abraão, pois este fora justificado diante de Deus pela fé e não pelas obras da
lei, portanto, o sinal da aliança não é a circuncisão, mas a fé (3.6-14). Ao
longo do texto epistolar o apóstolo vai desenvolver seu argumento, mas manterá
sempre em antagonismo os termos fé e obras da lei. Esse contraste serve para
distinguir a religião verdadeira da falsa. A religião verdadeira está ancorada
na graça de Deus, já a falsa acredita que os méritos humanos têm um papel
importante na obra da salvação. Essa digressão significava passar da graça para
outro “evangelho” (1.6-9).
Os gálatas persuadidos pelos falsos mestres voltaram aos
rudimentos fracos e pobres do judaísmo, que envolvia a circuncisão e a guarda
de dias (4.9; 5.2), era o retorno ao jugo da escravidão (5.1). Com essa atitude
estavam afirmando a insuficiência obra de Cristo na cruz (3.2-5).
O pano de fundo da carta revela que os gálatas estavam
supervalorizando o carnal em detrimento do espiritual (carnal e espiritual
apontavam respectivamente para as obras da lei e a obra do Espírito, esses
termos estão em conflitos nesta epístola). O apóstolo deixa claro que o homem
na carne, não pode agradar a Deus. Somente quando submisso e guiado pelo
Espírito Santo ele poderá receber a aprovação de Deus.
Somente quando
conduzido pelo Espírito é que o homem pode praticar a verdadeira religião. Meu
objetivo nesta noite é falar do Espírito Santo como aquele que nos capacita para
a prática da verdadeira religião.
Antes, um esclarecimento!
O novo nascimento, a conversão, não arranca do convertido a
sua natureza pecaminosa. Ele continuará tendo que resisti-la. Mesmo sendo alvo
da graça de Deus, o convertido em algum momento poderá praticar algo que não
seja compatível com a sua nova vida em Cristo (1Co. 3.3; 16). Sua conversão o
alista para uma guerra, a qual durará por toda a sua vida. Essa guerra é
chamada de mortificação. Nela temos um objetivo bem definido, qual seja:
“Fazei, pois, morrer a vossa natureza terrena” (Col.3.5).
O termo carne em
Gálatas
Em vários textos do Novo Testamento e principalmente nas
cartas paulinas o termo “Carne” é sinônimo de “natureza pecaminosa”. (Rm 7.5;
8.8,9). Essa natureza pecaminosa (a parte não convertida do crente) não tem
nenhum participação no processo da salvação (João 1.13). Mesmo os
homens mais espirituais padecem sob ela. (Rm 7.18,24).
Na epístola aos Gálatas o termo carne descrever na maioria
das vezes uma atitude de oposição à obra do Espírito (leia os capítulos 3.3;
4.29; 5.13, 16, 24; 6.8). Na epístola essa oposição significa simplesmente que
os crentes gálatas estavam substituindo a graça de Deus pelas obras mortas da
lei (2.21; 3.2.3). Aliás, o termo obras da lei é um sinônimo para o termo carne
aqui em Gálatas. Bem, como já sabemos o que é viver na carne, basta agora
perguntarmos o que significa viver no Espírito? Para tanto recorreremos ao
contexto epistolar, o qual poderá fornecer essa resposta, se não vejamos:
a) É viver na completa dependência de da graça de Deus. E
isso tem tudo haver com o contexto de gálatas (Eles buscavam a justificação
pelas obras), leia o capítulo 3.2-3.
b) É viver única e exclusivamente pela fé. O homem só pode
ser justificado pela fé. Qual quer pensamento contrário a isso é carnal, leia o
capítulo 3.9-10.
C) É viver debaixo das influências do Espírito. É andar no
Espírito. Isto é, acatando sua direção que nos é dada através da Palavra de
Deus. É entender que nenhuma atitude humana por mais religiosa que pareça ser,
é capaz de substituir o papel do Espírito na obra de santificação do crente,
leia o capítulo 5.16.
Com essas definições em mente podemos agora passar para os
pontos principais deste sermão.
I) O
fruto do Espírito resultando em uma vida cristã sob a direção de Deus.
“Ser cheio do Espírito Santo significa ter uma vida
controlada pelo Espírito”
(Sproul)
Antes de continuarmos, cabe aqui uma consideração
Notai que fruto aparece no singular e com artigo definido. A
razão para isso segundo alguns comentaristas é que Paulo está falando do amor e
de suas manifestações. Adolf
Pohl (comentário da carta aos
gálatas) acrescenta, o amor faz a abertura porque Deus é amor. No entanto, o
amor permanece presente até o fim da lista, de sorte que o resultado é o
desdobramento do amor em nove aspectos. P.
Burckhardt descreve assim os
desdobramentos do amor:
Alegria é o amor que jubila.
Paz é o amor que
restaura.
Longanimidade é o amor que
sustém.
Benignidade é o amor que se
compadece.
Bondade é o amor que doa.
Fidelidade é o amor que
confia.
Mansidão é o amor que se
humilha.
Domínio próprio é o amor que
renuncia.
O fruto do Espírito enfatiza a nova natureza do homem em Cristo. Essa nova natureza é plantada na alma do
crente mediante atuação do Espírito Santo. Isso significa que o crente
tem uma imbricação (forças que se sobrepõem) em sua natureza. De um lado, está à
voraz e inquietante inclinação pecaminosa, que recusa admitir a sua derrota. Do
outro lado, está a nova natureza forjada pelo Espírito, que busca sempre agradar a Deus. A guerra está travada! O dilema está posto! Mas nem tudo está perdido.
Eis que Paulo nos apresenta um caminho pelo qual poderemos começar a ganhar a
batalha: Andai no Espírito. Notai que eu disse: batalha. Pois a vitória nesta
guerra só será possível na parousia de Cristo. Quando Ele então transformará
nosso corpo corruptível em um corpo incorruptível. Até a volta de Cristo
experimentaremos sucessivas batalhas, mas em todas elas, se mantivermos a
atitude de andar no Espírito, venceremos.
O fruto na vida do crente é o resultado da ação do Espírito nele. Pois o
homem natural não pode produzi-lo. A única maneira de medirmos o
desenvolvimento espiritual de um crente é pela manifestação do fruto do
Espírito em sua vida.
É importante destacarmos que Espírito e carne são termos
contrastantes na epístola como já falamos. Espírito refere-se à obra de Deus em
nós, e carne é tudo o que se opõe a essa obra.
Paulo trabalha o tema fruto do Espírito bem no final da
carta, é como se ele tivesse propositadamente comparando dois tipos de religião. A
religião da carne, que se baseia nos esforços humanos e louva os méritos dos
homens. Esse era o tipo de religião que os gálatas foram persuadidos a voltar a
praticar. E a religião do Espírito, aquela que é baseada na graça de Deus e que
reconhece que tudo (e esse tudo é não apenas um tudo soteriológico) vem de Deus.
III) O fruto do Espírito como sinal da atuação do Espírito no
íntimo da alma do crente regenerado.
O fruto do Espírito é o resultado da ação do Espírito sobre
a alma do crente. Se o fruto é encontrado na vida do crente é sinal da atuação
de Deus em sua vida. Essa atuação é sempre “inside out” “de dentro para fora”.
O fruto é sinal de uma vida espiritual saudável e em perfeito processo de
santificação.
IV- O fruto do Espírito na prática da vida cristã
William Hendriksen divide essas nove virtudes em três
grupos, cada grupo contendo três virtudes. Cada grupo de virtude se relaciona
com um aspecto da vida do crente. Vejamos:
O Primeiro grupo estaria referindo-se às qualidades espirituais mais básicas: Amor, alegria, paz.
O segundo grupo indicaria
aquelas virtudes que se manifestam nas relações sociais: longanimidade,
benignidade e bondade.
No último grupo temos a
fidelidade referindo-se a relação dos crentes com Deus. A mansidão pressupõe a
relação dos crentes com outros homens. O domínio próprio refere-se à relação
que o crente tem consigo mesmo.
Conclusão
O ensino acerca do
fruto do Espírito nos convence que não nos salvamos por nossos méritos, por
nossos próprios esforços, ou como Paulo
gosta de colocar com outras palavras, pelas obras da lei. Guardar regras,
normas não tem valor alguma na tarefa de coibir ou mesmo controlar nossos
apetites carnais, menos ainda, quando falamos em salvação. A salvação é graça,
não há lugar aqui para uma meritocracia humana. Essa graça soteriológica se
manifesta na vida do convertido não apenas como mudança na sua condição
judicial, ele estava condenado, agora está absolvido, justificado, não, não é
só isso. Essa graça salvadora também se revela na vida do regenerado como fruto
do Espírito, o qual produz crescimento para que se possa atingir a medida da
varonilidade perfeita.